Já dizia o estudioso judeu do século X Hasdai Ibn Shaprut : “Se alguém é cruel consigo, como podemos esperar que seja compassivo com os outros?” Isso nos mostra que a compaixão pelos outros começa ao se trabalhar a AUTOcompaixão.
A compaixão é uma maneira de se relacionar com o sofrimento, seja o seu próprio ou o de outra pessoa. Geralmente temos uma tendência a dizer que somos mais gentis com os outros do que com nós mesmos, porém já foi comprovado com pesquisas que para conseguirmos ser verdadeiramente assim, precisamos ser igualmente gentis conosco também.
Nossa cultura acaba nos exaltando quando nos auto sacrificamos, pessoas que se dedicam incessantemente aos outros são vistas como fortes e guerreiras. Muitas vezes vemos mulheres, em geral mães, se dedicando aos filhos, casa e trabalho de maneira a não conseguir cuidar delas mesmas, chegando à exaustão. Mas está tudo certo, afinal são reforçadas socialmente por manter esse padrão. Quando essas mulheres buscam fazer algo para seu autocuidado, acabam sendo mal vistas ou julgadas indevidamente. Atendi várias vezes mulheres que iniciam o processo terapêutico com receio de estar ali durante aqueles 50 minutos, por não se darem o direito de estar ali e ainda mais tendo muitas dificuldades em conseguir uma rede de apoio para que elas possam sim se cuidar e esse cuidado gerar benefícios à todos que a cercam.
Outro ponto significativo da compaixão é assumir a capacidade de assumir o ponto de vista daqueles que estão sofrendo, assumir uma postura de não julgamento das posturas e erros alheios. Usando a compaixão podemos levar em consideração o que a outra pessoa sente. Através deste exercício olhamos para as coisas a partir do nosso interior e não do exterior, sendo assim é até possível sentir compaixão por aqueles que cometem erros, gafes e não pensam e nem agem como a gente.
Através da autocompaixão conseguimos também desenvolver a capacidade de olhar as coisas de uma perspectiva diferente. Se costumamos ver as coisas de um único ponto de vista, temos a tendência de uma rigidez maior, e quando conseguimos olhar como se estivéssemos “voando” por cima do fato, conseguimos ver e sentir coisas diferentes, com isso conseguiremos agir com mais compaixão pelos envolvidos.
Mas aí você pode me perguntar: Como sentir a dor do outro sem me sentir devastado por ela? Ou como sentir a dor de quem também me machucou? Para responder isso precisamos entender que a compaixão é algo relacional que se desenvolve através das relações e que é ela mesma que pode nos ajudar a reconhecer que é difícil sim estar próximo de pessoas que estejam sofrendo ou que lhe tenham feito algum mal, mas não devemos nos esquecer de nos oferecer conforto pelo nosso sofrimento também, com isso nos tornamos mais fortes e mais resilientes para lidar com a situação. Essa é uma habilidade que estou sempre atenta para ter dentro de mim diante do meu trabalho diário com o sofrimento daqueles que me procuram, sem deixar que interfira negativamente na minha vida pessoal.
O caminho que precisamos desenvolver é sempre estar em busca de se cuidar enquanto cuidamos dos outros. Tudo ao mesmo tempo! Não é fácil, mas garanto que com o tempo e com dedicação, aprenderemos!